Uma passagem por Ancara

A maioria dos viajantes evita Ancara, a capital da Turquia, e apesar desta cidade não ter grandes atractivos, parece-me que o faz erradamente. Ancara nunca conseguirá competir com a espectacularidade monumental e religiosa de Istambul, nem sequer com o ritmo e balbucio que advém do estreito de Bósforo, mas não deve ser menosprezada. Apesar de ser a segunda maior cidade do país, Ancara é uma verdadeira cidade turca onde se pode apreciar a vida diária dos seus habitantes, os mercados (não turísticos) cheios de gente e iguarias deliciosas, a devoção aos maiores santos do Islão e belos museus.

Depois de passar a noite a dormir no aeroporto e acordar com o nascer do sol a bater nos vidros das janelas estavamos prontos para o primeiro dia de viagem.
A nossa viagem até ao Irão levou-nos a fazer escala de um dia na capital turca e depressa decidimos que queríamos visitar o seu maior atractivo: Museu das Civilizações da Anatólia. Sabíamos que era um dos melhores museus dedicados a esta temática, e embora desta vez a Anatólia tenha sido trocada pelo Irão, queríamos seguir o plano. Muito tínhamos lido sobre este museu, inclusive que era o melhor da Turquia, no entanto, apesar de ser bastante bom, pareceu-nos inferior ao Museu Arqueológico de Istambul. Há que referir que também tinha um dos pisos encerrados, o que poderá ter contribuído para esta nossa opinião. Pagamos 15TL para entrar neste edifício otomano, antigo armazém do bazar da capital, e exploramos vários tesouros das diferentes civilizações que povoaram a Anatólia, nomeadamente no período Hitita, Urarciano, Frígio, Assírio e Clássico. Do período Hitita e Assírio existem painéis em relevo verdadeiramente impressionantes. No entanto, as pinturas do Neolítico, assim como as estátuas da idade do Bronze também nos deixaram boquiabertos. Ficamos com imensa vontade de regressar à Turquia e explorar a fundo as riquezas escondidas por esse país.

Do museu até à Cidadela é uma pequena subida. Embora mal sinalizada, é relativamente fácil encontrar a Cidadela Bizantina que se ergue num promontório e domina a cidade. As vistas do topo são avassaladoras. Montanhas nevadas cercam a cidade e casas de madeira precárias estendem-se pelas encostas das colinas. Com o devido desfasamento, lembro-me de La Paz e das cidades sul-americanas cobertas de favelas. Aqui senti a Turquia, um país muçulmano, o início do Médio Oriente, para quem vem de noroeste, algo que em Istambul não tinha sentido verdadeiramente. Istambul é uma cidade linda, com ritmo e monumental. Ancara tem alma turca. Há pouquíssimos turistas; cruzamo-nos com turistas turcos, um grupo de alunos de uma escola primária e pouco mais. As mulheres, de lenço enrolado na cabeça, tentam desesperadamente vender o seu artesanato. Apesar do sol, os turistas estrangeiros não aparecem. Está mau para o negócio.
Deambulamos um pouco pelos quelhos e vielas do bairro da Cidadela. É um autêntico bairro de lata, com população pobre mas sempre com um sorriso nos lábios. Em momento nenhum me senti ameaçada ou insegura mas, pelo sim pelo não, resolvi tirar fotografias com a máquina compacta. Pareceu-me pouco adequado exibir uma boa máquina naquele contexto.

Da Cidadela descemos até ao centro de Ancara. Tínhamos tirado o dia para visitar a cidade e nada melhor do que o fazer a pé. Almoçamos um Doner Kebab e um Köfte (almondegas) kebab num boteco de beira de estrada, por 9,5TL, e seguimos para a mesquita Haci Bayram Vedi, a mesquita mais venerada da cidade. Era hora de oração e os fiéis amontoavam-se nas entradas, de um lado mulheres do outro lado homens. O túmulo de Haci Bayram Veli, fundador da seita Bayrami, estava cheio de fiéis e foi-nos impossível entrar.
Toda esta área foi recuperada recentemente e está bastante aprazível. Os anciãos conversam sentados no banco do jardim, as mulheres passeiam e lancham junto aos chafaris, as crianças brincam. À minha volta não há turistas. Foi isto que me faltou em Istambul: há demasiado estrangeiros e poucos turcos.

Ao lado da mesquita está o Templo de Augusto de Roma, um templo romano de 30 a.C. Apesar do templo ter sido convertido numa igreja no período bizantino, ainda permanecem nas paredes exteriores inscrições que testemunham os feitos do Imperador Augusto. É um dos poucos lugares do mundo onde tal pode ser apreciado.
Deambulamos pela cidade e acabamos na Ataturk Boullevard, de onde nos dirigimos para a estação Vasa, onde apanhamos o autocarro de novo para o aeroporto (10TL). O dia em Ancara estava feito. No aeroporto esperava-nos uma verdadeira prova de fogo: conseguiriamos entrar no Irão?    

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