Hoje decidi escrever sobre a
Cidade do México. Poderia criar um texto onde o carácter principal fosse os
monumentos da cidade ou o seu fervilhar de gente e actividades. No entanto,
optei por algo bem diferente. Optei por fazer um texto de índole ambiental,
algo que me preocupa particularmente e que não posso deixar passar em branco
quando estou nesta cidade.
A Cidade do México é a 8º cidade
mais rica do planeta (tendo em atenção o seu PIB). Para isso contribuirá
certamente a vasta fortuna de Carlos Slim, o homem mais rico do mundo de acordo
com a revista Forbes, com uma fortuna avaliada em 68,4 biliões de dólares.
Para além de dinheiro, a cidade
parece ter pessoas. É 3ª área metropolitana maior do mundo e a 12º cidade,
assistindo a um crescimento progressivo e apresentando uma densidade
populacional de 5496 hab./km². Neste
momento ocupa cerca de 1/10 do Vale do México Central.
A Cidade do México é considerada
uma das cidades mais poluídas do mundo. Para além de se encontrar rodeada por
dois vulcões activos, encontra-se edificada num vale de montanha, criando um
“armazém” de poluição sobre a capital. Para juntar aos gases expelidos pelos
vulcões, a forte pressão demográfica e consequentes actividades industriais e
urbanas da população encarrega-se do resto. Em alguns meses do ano, devido à
circulação na atmosfera, a cidade permanece coberta por um smog. Os níveis de
Óxido de Azoto e Ozono troposférico são duas a três vezes superiores ao normal.
Para além disso, apresenta hoje os maiores níveis de monóxido de carbono entre
todas as cidades mais populosas do mundo. Os níveis de poluição atmosférica são
verdadeiramente alarmantes e respirar é uma tarefa cada vez mais difícil. Tão
difícil que o governo do Distrito Federal criou cabines de oxigénio para a
população. Em troco de 4000 pesos mexicanos (200€) pode-se respirar 90 segundos
de ar puro. Numa cidade onde se estima que morram 100 mil crianças por ano
devido à poluição, este é o preço a pagar por um ambiente despoluído! Mas ao contrário do que se possa
pensar, o problema da Cidade do México não está no ar… está no subsolo!

Apesar da altitude, as
precipitações são escassas durante parte do ano e aparecem concentradas na época
estival. Hoje, a falta de água é um problema mas nem sempre foi assim. Onde hoje está edificada a Cidade
do México existiu um sistema de lagos e aquíferos (reservatórios de água
subterrânea) fechados. O lago Texcoco era um lago endorreico, o que significa
que não tinha qualquer saída para o oceano. O lago trasbordava na época
estival, quando as chuvas eram mais intensas, e inundava os povoados existentes
onde é hoje a capital mexicana. Foi nas margens deste lago que floresceu
Cuicuilco, a cidade de onde partiram os Zapotecas para Teutihuacan, aquando da
sua destruição pelas erupções do vucão Xitle. Numa ilha do lago foi construída
Tenochtitlán, a cidade asteca. Os engenheiros astecas construíram uma série de
canais que lhes permitia controlar o nível da água do rio, evitar inundações e
aproveitar os recursos hídricos para a vida quotidiana. As águas do lago eram
salgadas devido ao substrato rochoso e os Astecas engendraram formas de
utilizar as águas da chuva de forma separada da água do lago. Viviam em
harmonia com a natureza.

Quando os espanhóis chegaram ao
México conquistaram Tenochtitlán e transformaram-na na sua capital colonial.
Durante a ocupação destruíram uma série de diques e canais e condenaram a
cidade a inundações. Segundo os escritos, Hernán Cortez mandou drenar as águas
dos aquíferos e dos lagos das imediações pois não queria que a sua capital se
parecesse com Veneza, uma cidade assolada por inundações, pestes e epidemias. A
capital da colónia deveria parecer-se com a cidade de Madrid. Recorrendo ao
trabalho escravo dos Astecas, cortaram as árvores que protegiam os sistemas de
água e destruíram todo o sistema. Com o passar dos anos, chegou-se inclusive a
abriu canais para ligar o lago ao rio Pánuco, mas nada parecia resultar. A
Cidade do México já estava abaixo do nível freático. Com 10 mil habitantes a
cidade parecia em perigo mas com 25 milhões será a mesma coisa?

Em 1967, iniciou-se um
megaprojecto de drenagem do lago e dos aquíferos - Drenaje profundo. Centenas
de quilómetros de túneis e canais drenam a água por baixo da cidade. Esta
drenagem continua e se por um lado evita as inundações, por outro enterra, literalmente,
a cidade. A drenagem das águas faz-se a um
ritmo tal que o aquífero sobre o qual a cidade foi edificada está a abater. A
cidade do México afunda-se vários centímetros por ano (entre 15 a 20 cm/ano). O
peso do desenvolvimento, das construções, da pressão demográfica afunda a
cidade de dia para dia. A cidade terá já afundado cerca de 8 metros só no
século XX. Na Catedral, no Palácio das Belas Artes, na Basílica de Guadalupe e
em vários edifícios do centro histórico já são visíveis as marcas desse abatimento,
as ruas e as casas cheias de fracturas (vejam bem as fotografias porque a
aparente inclinacao dos edificios e real). No Paseo de la Reforma, o Monumento
da Independência afunda 2 cm por ano e os estudos indicam que se terá enterrado
36 metros desde que foi erguido em 1910. Aquando da sua construção, a base ficava ao nível da rua mas com o
desnível, o governo começou a colocar degraus de pedra por baixo de forma a retardar seu
afundamento.

Os espanhóis negligenciaram o
poder da Natureza. Tentaram vencê-la. Não perceberam que é a água que escolhe o
seu lugar, o sítio por onde quer passar. Quando começaram a construir a
Catedral, esta começou logo a enterrar-se e mal colocaram o tecto, este ruiu.
Mas nem estes sinais o Homem escutou. Desde então tentou enfrentar a natureza,
tentou combatê-la. Está a seguir um caminho errado. Não é possível combater a
Natureza. O Homem tem que aliar-se a ela. Será que não aprenderam nada com os
Astecas?