A guerra do Vietname é um dos
marcos históricos do séc. XX, amplamente conhecida do grande público, mais que
não seja pelos inúmeros filmes de Hollywood dedicados a esta temática. O que a esmagadora maioria das
pessoas ignora é que a guerra no Vietname não foi o único conflito bélico no
sudeste asiático envolvendo os EUA, ou exércitos por eles treinados e
financiados. A verdade é que o sudeste
asiático tornou-se, nos anos 50, no palco por excelência para o desenrolar
dramático da guerra "fria" entre as duas grande super-potências da
altura, EUA e URSS. E mais concretamente, Laos e Cambodja estiveram no centro
de um conflito que se estendeu muito para além das fronteiras do Vietname.

A história pós-II Guerra Mundial
destes dois países é bastante semelhante. Ambos eram colónias francesas que se
tornaram independentes no inicio da década de 50, e ambos tinham facções
internas que se degladiaram pelo poder, logo desde a independência E, mais fundamental ainda, eram ambos países
muito pobres, sem infraestruturas, e dependentes da influência e intervenção de
países mais fortes (recuando séculos
Cambodja e Laos foram recorrentemente um campo de batalha entre impérios
que ocupavam as zonas que são agora a Tailândia e o Vietname).

Após o fim da segunda grande
guerra, seguiu-se a guerra da independência entre vietnamitas e franceses, que
culminou com a derrota dos franceses em 1954. Os EUA financiavam 80 % do
esforço de guerra francês numa tentativa
de estancar o avanço comunista e dando os primeiros passos na aplicação da
teoria do domino: se um país se tornasse comunista, era altamente provável que
um ou mais dos seus vizinhos tomasse o mesmo caminho. Na conferência de Genebra
desse ano, a Franca, Reino Unido, EUA e URSS decidem dividir o Vietname ao
longo do paralelo 17, marcando eleições gerais para 1956. As eleições de 1956
nunca se realizaram (pois os EUA temiam que o sufrágio popular pudesse pender
para o lado comunista) e formaram-se dois novos países a norte, a República Democrática do Vietname
(com apoio da URSS e China); a sul, a República do Vietname (com apoio dos
EUA). Em 1960, forma-se a norte a Frente de Libertação Nacional, ou Vietcong,
com o objectivo de reunificar o país. Estavam assim lançados os dados para que
os novos "jogadores" começassem a movimentar as suas peças no xadrez
do sudeste asiático algo que traria
consequências desastrosas para o Laos e Cambodja.

Tanto num país, como no outro,
formaram-se facções políticas militarizadas que se distinguiam pela tomada de
posição em relação ao conflito que se avizinhava no sudeste asiático No Laos, e apesar dos esforços na
constituição de um governo de coligação
teoricamente neutro, tanto os EUA como os vietnamitas do norte armaram
as facções que apoiavam e rapidamente o
conflito deflagrou. As forças vietnamitas infiltram-se no norte e centro do
Laos de modo a poderem transportar homens e armas fora do território vietnamita
e do "radar" americano (tal como no Cambodja) e os EUA decidem, em
1964, fora do conhecimento público e, claro, a revelia da ONU, começar a bombardear
o Laos. Estima-se que, entre 1964 e
1973, tenham sido largadas mais de 2
milhões de toneladas de bombas sobre o território do Laos. Durante o conflito,
as forças do norte foram ganhando terreno gradualmente e, com o cessar-fogo no
Vietname, os EUA começaram a retirar o apoio as forcas de direita, levando a
que o desequilíbrio de forças fosse tal que, uma após a outra, todas as regiões
do Laos foram caindo pacificamente nas mãos dos comunistas, culminando na
tomada da capital, Vientiane, em Agosto de 1975.

No Cambodja, o panorama geral foi
idêntico embora a proximidade com o
Vietname do sul fizesse com que os combates fossem muito mais sangrentos do que
Laos. Estima-se que na campanha de bombardeamento do Cambodja, iniciada em
1968, tenham sido largadas mais bombas do que aquelas que foram usadas por
ambos os lados na segunda guerra mundial! Em 1970, o governo em funções
(liderado pelo rei que via com maus olhos a influencia americana e da
Tailândia) foi deposto, num golpe de
estado apoiado pelos EUA, seguindo-se uma invasão de forças terrestres a partir
do Vietname do sul. Esta invasão não teve o efeito desejado pois, a norte, o
apoio militar dos vietcongs a uma facção das forcas comunistas (intitulados
Khmers vermelhos e liderados por Pol Pot) ganhava cada vez mais força, assim
como o apoio popular, alimentado pelo
apoio do rei a estes combatentes e o sofrimento causado pelos bombardeamentos
americanos. As forças apoiadas pelos EUA tiveram de retirar e os comunistas passaram a controlar a maior
parte do país. Mesmo depois do cessar-fogo no Vietname, os EUA intensificaram
os bombardeamentos na capital do Cambodja, mas em termos militares, estava-se
apenas a adiar o inevitável.

Em 17 de Abril de 1975, duas
semanas antes da queda de Saigão, Phnom Penh rendia-se aos Khmers Vermelhos e,
apesar dos festejos da população exausta ao fim de 5 anos de guerra civil, o
que poucos poderiam adivinhar era que um inferno ainda pior estava prestes a
começar para o povo do Cambodja.