Na costa oeste do Mar Morto,
cerca de 12 km a sul de Jericó, encontra-se um complexo de ruínas conhecido como
Khirbet Qumran. Hoje é um lugar ermo e silencioso, apenas perturbado ocasionalmente
por autocarros de turistas que por aí passam, mas há cerca de 2000 anos este
lugar era o centro de uma comunidade religiosa judaica (tradicionalmente
identificada com os Essénios, de acordo com relatos romanos da época),
conhecida pelo fervor e modo de vida ascético dos seus seguidores. Aquando da
primeira guerra judaico-romana, que terminou com a captura de Jerusalém e a
destruição do Templo, a comunidade foi obrigada a abandonar este local,
dispersando os seus habitantes por variados locais, incluindo a fortaleza de
Massada, último reduto judaico, que viria a cair alguns anos mais tarde. Os
pormenores, obviamente, não são conhecidos, mas crê-se que, durante esta época
conturbada, alguns membros da comunidade resolveram esconder os textos mais preciosos
da Lei pela qual se regiam, em grutas situadas em penhascos próximos.

Provavelmente, nenhum desses homens sobreviveu à investida romana durante os
anos seguintes e, assim, o segredo da localização dos textos morreu com eles.
Ninguém voltou para recolher os textos e lá permaneceram até que, na Primavera
de 1947 (durante os últimos meses do mandato britânico na Palestina), um pastor
beduíno subiu a uma gruta e tropeçou nos primeiros Manuscritos do Mar Morto a
verem a luz do dia em quase 2000 anos. Entre os manuscritos encontrados nesta
gruta, destacavam-se um manuscrito completo de Isaías, um Manual de Disciplina,
que mais tarde recebeu o nome de Regra da Comunidade, e outro que descrevia a
guerra entre os Filhos da Luz contra os Filhos das Trevas. Entre 1951 e 1956
foram descobertas mais 10 grutas, saindo de duas delas quantidades substancias
de material, enquanto que as ruínas de uma povoação nas proximidades das grutas
começaram também a ser escavadas. Foram descobertos milhares de fragmentos em
papiro ou couro, uma dúzia de manuscritos completos em couro e um gravado em
cobre (o chamado Rolo de Cobre).

A maior parte dos manuscritos
encontra-se escrita em hebraico, uma porção mais pequena em aramaico e só uns
poucos em grego. Estão presentes todos os livros das Escrituras Hebraicas, pelo
menos em fragmentos, alguns Apócrifos (trabalhos religiosos que não se
encontram nas Escrituras hebraicas mas que estão incluídos na Septuaginta, a
Bíblia dos Judeus de fala grega) e ainda outros textos que não conseguiram
atingir o estatuto canónico, tanto na Palestina como na Diáspora.
O carácter único da descoberta de
Qumran deve-se ao facto de não ter sido possível, até então, encontrar nenhum
texto judaico, escrito em hebraico ou aramaico, que remontasse ao período pré-cristão.
Por exemplo, o mais velho texto hebraico de Isaías era um códice encontrado no
Cairo e datado de 895 d.C.!
Qumran contribuiu, assim, de uma
forma essencial para o estudo da génese das composições literárias judaicas. No
entanto, a verdadeira e total novidade foram os chamados Manuscritos sectários
do Mar Morto, um conjunto de livros de regras, interpretações da Bíblia de
vários tipos, poesia religiosa, calendários sectários e textos litúrgicos. É de
referir, no entanto, que nenhum dos manuscritos pertence ao género histórico.
As pessoas e acontecimentos sectários neles referidos são descritos em
linguagem críptica, enquanto concretização de antigas profecias relativas aos
Últimos Dias e à vinda do Messias. As teorias e interpretações modernas destes
textos são, por isso, muitas e variadas!

Com a ocupação de Jerusalém Este
na Guerra dos Seis Dias, todos os fragmentos dos manuscritos que estavam no
Museu Arqueológico da Palestina ficaram sob o controlo do Departamento de
Antiguidades de Israel, podendo alguns deles ser admirados no Santuário do
Livro (um edifício moderno com a forma das tampas dos recipientes onde foram
encontrados os manuscritos), no Museu de Israel, em Jerusalém. Só o Rolo de
Cobre (que descreve, em linguagem críptica, 64 esconderijos de metais preciosos
e manuscritos) e alguns outros fragmentos permaneceram em mãos jordanas e podem
hoje ser vistos em exposição no (pequeno mas cheio de peças interessantes)
Museu Arqueológico Nacional, em Amã.
Finalmente, é de salientar que
foi publicada em 2006, pela Ésquilo, uma tradução portuguesa destes textos,
realizada a partir de uma edição de Geza Vermes, investigador académico de topo
nesta matéria.