Gize, o subúrbio do Cairo, podia
nunca ter saído do anonimato não fosse lá estar localizada a única das 7
Maravilhas do Mundo Antigo ainda de pé. No entanto, Gize vive hoje com
problemas sociais decorrentes da localização das grandes pirâmides no seu
espaço geográfico. Um turista que chegue ao Cairo numa viagem organizada será
levado de autocarro até ao planalto de Gize e ai enfrentará a fila para comprar
bilhetes e desfrutará da beleza das grandes pirâmides. O viajante enfrenta
outros desafios.
As grandes pirâmides sempre
atraíram exploradores e há séculos que a população local compreendeu que pode
lucrar com este complexo. O governo egípcio cobra-se de taxas para as visitas. A entrada no recinto custa 8 euros e não dá acesso a nenhum
monumento. Quem desejar visitar o interior da pirâmide de Queops terá de
desembolsar 15 euros, e 5 euros pela pirâmide de Kefren. Dentro do recinto, o
Museu do Barco Solar custa 7 euros e apenas a Esfinge pode ser visitada sem se
pagar.

No entanto, não foi só o governo
egípcio que se apercebeu que os turistas estão dispostos a pagar grandes
quantias de dinheiro para "coleccionar" esta maravilha. Uma companhia
privada orquestra um espectáculo de luzes e som, basicamente iluminando as
pirâmides durante a noite, e cobra 11 euros por bilhete. E onde fica a
população local? Onde fica o desenvolvimento sustentável do subúrbio de Gize?
Toda a gente enriquece com as pirâmides, mas e os habitantes que vivem lado a lado
com este monumento? Também esses resolveram melhorar a sua situação financeira.
Hoje, à volta das pirâmides, existe uma espécie de gang organizado que tenta
extorquir o máximo possível ao viajante independente. Este gang, nas imediações
do recinto, bloqueia a passagem dos táxis que transportam estrangeiros,
instalando o medo e fazendo demonstrações de agressividade. Tentam, por
variadíssimos esquemas, impedir a passagem dos táxis e levar os viajantes a
deslocar-se de cavalo ou camelo até ao recinto. Apesar da policia tentar
controlar a situação (que de acordo com os locais melhorou bastante) o gang
estendeu a sua área de influencia a locais mais afastados. Sem grandes
problemas e graças à perícia dos dois taxistas que nos levaram a Gize,
conseguimos alcançar as pirâmides sem grandes distúrbios e recorrendo apenas a
diálogo e apertos de mão. Uma vez em Gize, descobrimos que também os menos
agressivos encontraram maneira de sobreviver.

A volta das pirâmides, os recintos
estão cheios de camelos e cavalos que esperam a abertura do complexo para
poderem entrar. Em tudo semelhante a um mercado de gado, os animais esperam em
fila para fazerem as delicias dos turistas. O viajante tem o privilegio de
testemunhar a máquina turística que se engendra por trás da única Maravilha do
Mundo Antigo. Aquando da abertura do recinto, os turistas começam a chegar, de
todas as nacionalidades e falando todas as línguas. A população local também
investiu na educação porque os vendedores dominam agora o básico de todos os
idiomas! Apesar de todo o espectáculo que
rodeia as pirâmides, estes edifícios com milénios de história não perderam o seu
esplendor.

Gize substituiu Sakkara como
necrópole de Menphis e exibe os mais inigmáticos e gigantescos complexos piramidais
do mundo. Os faraós, em tempos, escolheram este local para o seu repouso
eterno. A Esfinge guardou durante séculos o planalto de Gize, protegendo os
seus faraós de guerras árabes, guerrilhas tribais, invasão napoleónica,
colonização inglesa e os saques perpetuados pelo homem geração após geração.
Essa protecção esteve longe de ser pacifica. Para além de desfigurada, a
Esfinge não impediu o saque do interior das pirâmides e túmulos. Hoje, a Esfinge enfrenta um novo
desafio: preservar as pirâmides e todo o complexo do ataque dos turistas. Subir
as pirâmides já é proibido mas pode-se entrar e sair sem qualquer controlo,
"ver" com as mãos os túmulos e representações nas rochas, saltar e
subir as Mastabas e os túmulos. Até quando resistirá esta maravilha? Será a
humanidade capaz de preservar aquilo que as areias do deserto tão bem fizeram
durante milénios?